Email a Oscar Mascarenhas

(Quando me pediu para permitir a publicação no JF «O Patacho», a primeira crónica de dois anos de colaboração regular no Jornal do Fundão, enviei-lhe este texto que andou perdido e aqui deixo para registo, numa homenagem ao saudoso amigo).
(Publicada em 31 janeiro de 2003)

Não tenho a modéstia nos meus defeitos, mas nunca supus um jornalista consagrado a agradar-se da minha prosa, nem uma referência da imprensa portuguesa a acolhê-la.

E tal como Picasso, quando, junto à Guernica, lhe perguntaram os alemães se tinha sido ele a fazer aquilo, lhes respondeu que não, tinham sido eles, os alemães, também eu lhe digo, em verdade, que a crónica não fui eu que a fiz, foram os tempos em que vivi, as gentes que então mandavam, as circunstâncias que eram. Apenas me limitei a transcrever de memória alguns episódios.

Tão pouco podia adivinhar o verso da folha do JF com tão lúcidas reflexões sobre o panorama audiovisual, grito de inteligência sublinhado pelo desespero do traço de Eduard Munch que em Oslo vi encher, de gritos igualmente lancinantes, o museu com o seu nome e o Nacional, em repetidas metáforas de um mundo de pesadelo que adivinhou ou que, existindo sempre, dele se tem agora melhor perceção e mais alargado conhecimento. 

Custa-me não estar à altura de poder franquear a porta que me abriu para frequentar as páginas honradas do JF com regularidade, mas não deixarei de submeter ao seu escrutínio uns textículos (palavra que tomo de empréstimo do Luís Pacheco), prosador fadado e malfadado editor, bastando-me como óbolo o enfado de lê-los, selecioná-los e corrigi-los, com o suplemento dos abraços com que me ameaça e que anseio por cobrar.

Deixe que lhe conte como andei uma vida inteira a pensar que Carvalhão Duarte me convidara para colaborar no “República”, vaidade que carreguei silencioso três décadas e meia. Nada disso. Há cerca de 2 anos descobri que ele apenas me abrira as páginas do jornal a que eu me oferecera como correspondente, na sequência de uma subscrição para a rotativa que teve carácter de plebiscito nacional e que promovi na Lourinhã. O meu amor-próprio sofreu um rude golpe quando descobri na Torre do Tombo uma carta que a PIDE apreendeu e em que eu me oferecia para correspondente, certamente de forma reiterada. Livrou-se o “República” da minha prosa graças ao ministro da Educação de turno que indeferiu o pedido de autorização que então lhe solicitei.

Finalmente esclareço que mudei de Distrito (Castelo Branco) porque o Director Manuel da Silva Mendes me ameaçou de demissão se o não fizesse, mas mudei de vida porque “também de pão vive o homem”, como aleguei no ofício em que pedi a exoneração em 1971, depois de me ser ilegalmente indeferido o pedido de “licença ilimitada”, com a ameaça de que abandonaria o ensino independentemente do despacho de S. Ex.ª o Ministro (Veiga Simão), o que fiz sem conhecimento da decisão, por razões meramente económicas, a partir da escola n.º 44 em Lisboa, ao cimo da Rua da Beneficência.

Desejo-lhe as maiores felicidades e vou inclui-lo, como tomei a liberdade de o fazer já para as “Notas Soltas” de janeiro, na lista de amigos que fustigo com a minha prosa. Em anexo segue outra crónica, igualmente verdadeira e pouco gloriosa.

Um abraço. Esperança

Apostila – Acabei colaborador de Jornal do Fundão, durante dois anos (2003/2005, tendo Oscar Marcarenhas como chefe de redação e Fernando Paulouro como diretor. Essas crónicas estão na base do livro «Pedras Soltas», prefaciado pelo primeiro. Fernando Paulouro havia de me prefaciar o recente livro de crónicas «Ponte Europa», muitas delas publicadas no JF, mas já sem colaboração regular.

(Ortografia atualizada)

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