Belém, o novo governo e a insustentável leveza de Cavaco…

Ao que consta na comunicação social o líder do PSD terá comunicado hoje ao Presidente da República que “cabe ao PS construir uma solução de Governolink.

Não se percebe porque só agora o PSD decidiu dar tréguas à virulenta chicana política a que se dedicou, de corpo e alma, desde 4 de Outubro e subitamente resolveu ‘descer à Terra’.

Claro que a Direita vai afirmar aos quatro ventos que o faz pelo sentido da responsabilidade e considerando o ‘interesse nacional’. Todavia, decorrido este longo lapso de tempo o que a Direita verifica é que não existe o ‘esperado’ clamor dos parceiros europeus, nem se verificou uma apocalíptica balbúrdia nos ‘mercados’.
Mais a Direita finalmente acordou e compreendeu que a sua continuação como Governo de gestão dentro do actual contexto existente na Assembleia da República equivalia a ser ‘cozinhada em lume brando’. Esta seria a hipótese mais benigna.
Porque existem condições objectivas para, no caso de o PS não ser chamado a formar Governo, o clima social se tornar insuportável. Esta a hipótese realista.

Na realidade, hoje à saída do palácio de Belém notam-se as primeiras linhas de fractura na coligação de governo formada pelo PSD e CDS após as eleições. A posição de Paulo Portas é nitidamente divergente da de Passos Coelho. O significado desta décalage entre Portas e Passos Coelho adquirirá visibilidade e profundidade no futuro, nomeadamente, no exercício do papel de Oposição. Mas poderá ter epifenómenos mais próximos, isto é, na campanha presidencial já no terreno.

Corre à boca pequena que Cavaco Silva poderá vir a solicitar a António Costa para formar Governo. E ao fazê-lo deveria tentar impor condições draconianas para o seu exercício. Como, por exemplo, a demissão a prazo do executivo que se disponibilizaria para (temporariamente) empossar. De um antro onde se congeminou uma 'intentona informática' nada poderá ser descartado.

Mas, na realidade, as posições que a coligação PSD/CDS tem tomado enfermam de uma gritante contradição. É evidente que o caminho desejado por Paulo Portas e Passos Coelho é a repetição do acto eleitoral. Ora, nada mais favorece esta 'airosa saída' para os interesses da Direita do que uma real fragilidade que leve ao desmoronar da solução apresentada pela Esquerda. Daí que a ‘gritaria’ sobre a fragilidade e a inconsistência do entendimento entre PS, BE, PCP e PEV esteja impregnada de uma imensa hipocrisia. O grande receio da Direita é que a alternativa gizada entre o PS e os partidos à Esquerda tenha pernas para andar. O problema não é o que falta no entendimento acordado pela Esquerda mas efectivamente o que lá está.
Aliás, um outro aspecto decorrente da lentidão da reacção à crise instalada pela rejeição do Governo Passos Coelho/Paulo Portas poderá ser esta notória contradição entre o ser e o parecer. Esta situação dialéctica poderá continuar funcionar como o factor determinante para o ‘engonhanço’ do Presidente da República que, como já demonstrou ao longo do mandato, não está a ‘brincar aos feijões’.

Não tendo em boa conta o discernimento de Belém será previsível que os seus assessores tenham conhecimento concreto da composição do leque partidário que oferece ao PS condições para Governar. E que, tendo em consideração a existência de um conjunto de partidos, diversificado e carregado de poderosos factores identitários e até doutrinais (como repetidamente afirmam), é difícil, para não dizer completamente abstruso, tentar chantageá-los, intrometendo-se nas entrelinhas do acordado.
Este tipo de pressões não é possível, nem viável, quando estão envolvidas no processo 4 distintas formações partidárias. O Presidente da República deve ter a noção que num caso desses, perderia por completo o controlo da situação (que já é excessivamente deficitário).
Ou, então, Belém poderia ficar no colo com o cenário de um possível regresso ao cenário de um ‘Governo de gestão’ em confronto quotidiano com uma maioria de Esquerda na Assembleia da República decorrente que um gesto insensato e imprudente da Presidência da República (como o que mencionamos e foi posto a circular nos ‘mentideros’ políticos) só viria a agravar a situação política do País.

Cavaco Silva tanto ‘engonhou’ que, neste momento, já não tem saídas. Este é o resultado decorrente da afirmativa capacidade de ‘previsão de todos os cenários’ que, de modo jactante, anunciou acerca das eleições legislativas. 
O Presidente ficou prisioneiro da teia de aranha que, tenazmente, construiu. E na teia urdida está também a diletante leveza da mediação presidencial que muito se aproxima da insustentabilidade.

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