Passos Coelho: penso, logo existo…

A exuberante deputada Heloísa Apolónio a propósito da última entrevista de Passos Coelho na RTP 1 chamou a atenção para uma pequena frase (que passou ao lado dos comentários) denunciadora de laivos de autoritarismo que foi pronunciada sobre a ‘missão’ do primeiro-ministro. Coelho dixit: "que foi escolhido para pensar pela sua cabeça". link

Já sabíamos - desde há muito - que Passos Coelho tinha rasgado o contrato eleitoral. Na verdade foi eleito com um programa e o seu papel é substancialmente diferente do que pensa. Compete-lhe executar o programa anunciado. Por isso é que muitas vezes o Governo é denominado como o ‘Executivo’. Esta aleivosia do primeiro-ministro é denunciadora de uma cultura democrática frágil e enviesada. Julga-se escolhido para levar a cabo um trabalho messiânico o que, antes de tudo, mostra a grande dificuldade em entender o seu papel. Para que não restem dúvidas os proclamados ‘salvadores da pátria’ raramente são eleitos (escolhidos para esse fim). Na maior parte das vezes proclamam-se, ou fazem-se proclamar.

Aliás – e regressando à citada entrevista – foi penoso assistir às dificuldades que Passos Coelho exibiu sempre que foi confrontado, pelos entrevistadores, com o seu programa eleitoral e/ou de governo.

Os portugueses que têm uma longa e trágica experiência histórica de ‘messianismos’ (o 'sebastianismo' terá sido o expoente máximo e duradouro). O paralelismo não é desejável mas possível. Os falsos D. Sebastião surgiram durante o ‘interregno’ em que fomos administrados do exterior (Madrid, no caso vertente). No actual período, com uma soberania tutelada os apetites messiânicos tendem a reaparecer.
Desde o ‘rei de Penamacor’ até à consolidação da dinastia de Bragança existiram muitos candidatos e, sublinhe-se, todos com um triste fim. É por estas razões que a petulância do 'reizinho de Massamá' aparece como insuportável.

A infeliz entrevista exibiu uma realidade que todos os governantes deveriam ter presente. Portugal não existe como uma entidade mítica (ou um espaço imaterial – financeiro, p. exº.). Existem portugueses e portuguesas. Não precisamos de ‘salvadores da pátria’. Precisamos de alguém que nos ajude a fazer uma caminhada firme, certa, e tranquila para (re)conquistarmos a soberania, a dignidade e a prosperidade (palavra proibida para o governante). Precisamos que nos seja reconhecido o direito (e o dever) de pensarmos pela nossa cabeça. Queremos ser cidadãos.
A pergunta é: como foi possível perorar durante hora e meia ignorando ‘isso’?

Esperemos que, hoje, sábado, no seu recanto de Massamá ‘sinta’ os portugueses e as portuguesas que olimpicamente ignorou na entrevista do dia 13. Eles e elas vão ‘mostrar-se’ por todo o País, saindo à rua em 40 cidades.

E, finalmente, resta aguardar que amanhã (...depois de dormir pouco, mas 'descansado') não seja um dia de nevoeiro. Já chega de 'messiânicos devaneios'.

Comentários

Diz Passos Coelho que "dorme descansado". Não me custa a acreditar. É caraterístico da psicologia desse género de personagens. A sua indiferença pelas pessoas é tal que o mal que fazem aos outros não lhes tira o sono. Mesmo noutros campos que não o da política, todos nós conhecemos
grandes burlões, alguns com graves processos judiciais às costas, que podem levá-los à cadeia, que se passeiam pelas ruas todos risonhos e dormem descansadíssimos.

Só não dorme descansado o cidadão honrado que tem uma pequena dívida para saldar e não tem dinheiro para a pagar. Ou o honesto pai de família que no fim do mês já não tem dinheiro para dar de comer aos filhos. Os que devem muito a muita gente dormem descansadíssimos.

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