Política do: ‘Só nós dois é que sabemos’…*

O ‘ambiente’ político nacional está cada vez mais empestado, mais opaco e, surpresa, 'virou-se' para a vertente mística.

Primeiro, o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, mostra-se displicente e pouco convencido com o derrapar das receitas (impostos) link.
Não admite que errou nas previsões orçamentais, nomeadamente, sobre a colecta.
Perante o aprofundamento da recessão (este valor consta do OGE) manteve a peregrina ideia de era possível aumentar a receita à custa de uma maior eficiência na cobrança e na fiscalização esquecendo as falências em série que lhe esvaziam o IRC e as desmesuradas subidas do IVA que favorecem a 'economia paralela' ou, usando o 'economês': informal.
Confrontado com os números deixa em suspenso a ideia que poderão ser necessárias novas medidas de austeridade para chegar ao deficit previsto para este ano (4,5%). De facto, o total descalabro para um tão bom aluno que não se cansa de apregoar que não precisa de ‘mais dinheiro, nem de mais tempo’. Um ministro que julga ter os portugueses a jeito para novos voos de austeridade que ‘sustentem’ um modelo que tem sido permanentemente contrariado pelo números e pelos factos. Resta-nos, portanto, acreditar no Pai Natal. Ou, então, que seja rigoroso quando falar. Deverá proclamar: 'não preciso de mais tempo, nem de mais dinheiro, só necessito de mais austeridade'.


A próxima grande batalha eleitoral trava-se nas autarquias. Neste fim de semana so autarcas do PSD estão reunidos em Sintra.
As eleições autárquicas serão o primeiro teste popular às políticas governamentais em tempo de crise e com uma leitura ideológica do Memorando de Entendimento em vigor há 1 ano.
As eleições autárquicas não têm obrigatoriamente um reflexo directo sobre a Governação. Todavia, e apesar disso, os portugueses sabem que um desaire autárquico travaria de modo irremediável a senda neoliberal que tem vindo a ser seguida. O PSD está metido num 'colete-de-forças' pela teimosia em prosseguir políticas de empobrecimento, do desemprego, de cegas restrições orçamentais das Câmaras Municipais e de desertificação de Interior. Os ‘barões laranja’ (os novos e os velhos) sabem que o perigo de uma derrocada espreita. E que as eleições autárquicas podem, de modo indirecto, paralisar o Governo. Por isso são invocadas – como fez Miguel Relvas - ‘ligações e afectividades’ divinas. Relvas sobre uma eventual candidatura de Seara à Câmara de Lisboa, disparou: “Só Deus sabe o que eu gosto dele”… link
Se Fernando Seara, em resposta, assumisse também uma postura divina (em consonância com as declarações de M Relvas) podia, muito bem, usar o célebre jargão das ‘aparições’ de Fátima: "O que é que vossemecê me quer"? Seria difícil ao ministro explicar.

Mas é de crer que os portugueses saberão – em 2013 - responder .

(*) – canção de Tony de Matos com letra da autoria de Joaquim Pimentel.



Comentários

Carlos Ferreira disse…
Podendo concordar nalguns pormenores, discordo no entanto profundamente do pano de fundo que serve de cenário a este texto.
A qualidade da democracia assenta essencialmente na cultura cívica dos cidadãos e em nome dessa cultura devemos todos ser rigorosos no que escrevemos.
As eleições autárquicas servem única e exclusivamente para que em cada um dos nossos concelhos nós procedamos à eleição dos que entendemos serem os mais aptos e adequados a dirigirem os destinos da nossa terra.
Muitos são os eleitores que quando chega a hora das autárquicas votam em candidatos que são apoiados por partidos diferentes do da sua preferência, quando se colocam questões de ideologia ou de governo nacional.
Pessoalmente acredito vivamente na democracia.
Felizmente vivo num concelho republicano onde esta perspectiva e cultura cívica é uma constante.
No meu concelho todos os órgãos autárquicos já foram ganhos pelos candidatos apoiados pelo menos por mais do que um partido.
No meu concelho as eleições para a câmara municipal foram ganhas por uma candidata apoiada por um partido e no mesmo dia as eleições para a assembleia municipal foram ganhas por um candidato apoiado por outro partido.
No meu concelho nas penúltimas eleições legislativas um dos partidos ganhou com maioria absoluta tendo uma das maiores votações percentuais nacionais e um mês depois as eleições autárquicas foram ganhas por uma candidata apoiada pelo partido principal opositor.
Isto é democracia. Isto é cultura cívica do povo. Penso aliás que é esta cultura cívica da gente do meu concelho que tem permitido o seu crescimento e desenvolvimento sustentado.
É esta a cultura e maturidade cívica porque nós, como bons republicanos, devemos pugnar.
Por isso não posso concordar com qualquer teoria, mesmo que levemente insinuada em pano de fundo, de que as eleições autárquicas possam ou devam servir para manifestações de desagrado, ou cartões verdes, amarelos ou vermelhos, a um qualquer Governo ou ideologia no Governo.
Ontem, hoje ou amanhã, com este ou com qualquer outro Governo este é um discurso perigoso e subversivo para a própria democracia.
Eventuais ganhos políticos de momento serão sempre manifestamente inferiores aos prejuízos futuros.
Na minha opinião uma parte da podridão da nossa democracia advém precisamente da facilidade com que os nossos políticos se foram deixando cair neste tipo de aproveitamentos demagógicos.
Penso que, pelo contrário, a nossa obrigação enquanto cidadãos civicamente preocupados e que temos o privilégio de ter acumulado algum conhecimento, é a de sermos guardiões da liberdade e como tal da nossa democracia e da sua qualidade.
Assim penso que devemos antes exercer, pelos meios ao nosso alcance, a necessária pedagogia de modo a evitarmos que oportunismo e demagogias de momento desvirtuem o significado dos actos eleitorais, pilares dessa mesma democracia.
Os Governos sufragam-se e elegem-se por via das eleições legislativas. São essas, e apenas essas, as eleições que servem para eleger parlamentos e para construir ou não maiorias capazes de promoverem Governos para governarem o país.
É por vía das eleições legislativas e das revoluções que os Governos se derrubam. As eleições autárquicas, bem pelo contrário devem servir tão só e apenas para elegermos os mais aptos para liderarem os destinos das nossas terras.
Sou social-democrata e anti-neoliberal. Sou um acérrimo defensor da causa pública e do estado-social.
As ideologias e as práticas erradas dos governantes combatem-se no parlamento e na rua. Seja através de manifestações seja através de artigos de opinião, blogues e redes sociais, ou ainda através da participação de cada um em partidos e em movimentos cívicos.
Estou certo que a intenção deste texto não foi nem é alimentar este tipo de confusão entre objectivos dos vários actos eleitorais, nem é isso que está escrito no texto.
Tenho no entanto receio que uma leitura mais imediatista pudesse gerar algumas confusões.
Assim, junto aqui esta reflexão pessoal.
e-pá! disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
e-pá! disse…
Caro Carlos Ferreira:

No texto ressalta-se: "As eleições autárquicas não têm obrigatoriamente um reflexo directo sobre a Governação".
E digo 'directamente' exactamente para evitar confusões. Na verdade, a nossa experiência histórica não é isenta de incidentes: António Guterres provocou a demissão do XIV Governo Constitucional em Outubro de 1999, após uma estrondosa derrota autárquica.

Existe de qualquer maneira - em qualquer tipo de eleições - uma insanável dicotomia. As diferentes eleições têm em princípio objectivos e âmbitos diferentes. Todavia, no cerne da questão eleitoral estão - em força - os partidos políticos. As excepções das eleições autárquicas onde podem concorrer candidatos independentes são a excepção que confirma a regra.
Sendo assim, as eleições lato sensu testam - escrutinam - as forças partidárias no terreno. E são elas que, de facto, sustentam os Governos (quaisquer que sejam).
Embora concordando com a destrinça entre os diversos tipos de eleições (legislativas, europeias e autárquicas) nomeadamente em relação aos objectivos institucionais, em meu entender, todas levantam ondas de choque políticas que convém não ignorar.

Como dizia Churchill: "A política é quase tão excitante como a guerra e não menos perigosa. Na guerra a pessoa só pode ser morta uma vez, mas na política diversas vezes."
As eleições - quaisquer que sejam - podem ser (não serão obrigatoriamente)isso: uma 'queda sequencial'...ou a 'entrada em contra-ciclo'.
Por isso, a sua preparação deve ser seguida atentamente e tem - necessariamente - multiplas 'leituras'.
Em política nada será estanque.

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