Quando a direita perde a vergonha

Winston Churchill dizia da democracia que era o pior dos sistemas políticos, com excepção de todos os outros. Só não disse que era dos mais frágeis porque não usa os métodos das ditaduras: violência, poder discricionário, polícia política, demissões da função pública, transferências disciplinares.

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Hoje, em Portugal, assiste-se a uma conspiração subtil e persistente contra o regime democrático, denegrindo o primeiro-ministro como se fosse legítimo temer a abolição de eleições livres. Ao mesmo tempo branqueia-se a ditadura fascista de Salazar.

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Esquece-se deliberadamente Caxias, Tarrafal, Aljube, Peniche e a sede da PIDE na Rua António Maria Cardoso onde a polícia suicidava presos da janela para a rua. A mulher do embaixador Álvaro de Lins assistiu em directo a uma dessas quedas macabras que o ditador desvalorizou.

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Esquece-se o Tarrafal, Timor e o Campo de S. Nicolau, em Angola. Insultam-se os que se exilaram para não serem cúmplices da guerra colonial, onde se mataram mulheres e crianças com Napalm e se torturaram e assassinaram soldados do PAIGC, FRELIMO e MPLA.

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Silenciam-se as torturas do sono, estátua, choques eléctricos, queimaduras de cigarros, simulações de fuzilamentos e agressões aos presos políticos.

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Tive um colega e excelente amigo, Alfredo Pereira, que era sargento cadete na revolta da Mealhada. Foi demitido do exército e, em cada emprego que arranjava, era demitido 2 ou 3 dias depois por pressão da PIDE junto da entidade patronal. Valeu-lhe o patrão do Laboratório Seber que recusou a chantagem. Pagou-lhe o Pereira com dedicação exemplar e a recusa de melhores lugares quando chegou o 25 de Abril.

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Não costumo responder aos anónimos que fazem desafios nas caixas de comentários mas lembro aqui o massacre de Wiriamu (Moçambique),cerca de 400 mortos, e os muitos que foram morrer a casa, saídos com tuberculose das enxovias da PIDE.

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Bastaria a ausência de liberdades sindicais e a existência de um partido único para fazer corar os que tão depressa esqueceram um regime de terror, opressão, guerra e perseguições.

Comentários

ana disse…
Não posso de maneira alguma aceitar a leviandade com que são feitas comparações entre a ditadura e o actual regime.Só quem na altura viveu de joelhos ou não viu porque não quis ver, pode pretender que hoje se vive em situação semelhante. Basta o exemplo deste blogue: cada um diz o que quer, seja verdade ou mentira. Há caluniadores de serviço a quem nada acontece (mas devia acontecer, calúnia é crime).Dizem mentiras como se fossem verdades. E ainda têm o despudor de criticar a democracia. Fizessem eles por uma vez, no passado, o que fazem hoje, e logo veriam o que é bom para a tosse. Mas aí não faziam, de certeza. Ficavam quietinhos, caladinhos, a lamber botas.
e-pá! disse…
A DIREITA NÃO TEM VERGONHA!

TEM MEDO DO FUTURO!

No capítulo das liberdades a direita perde com frequência a vergonha, ou antes, o bom-senso.
Melhor, gosta de misturar chavões, artimanhas semânticas que, lidas de relance, parecem o essencial.

Ataca-se o regime democrático saído do 25de Abril empolando-se questões sociais emergenetes em todo o Mundo, como a violência, ou, então, questões económicas como o empobrecimento da população, vitima das políticas imobiliárias norteamericanas ou da especulação sobre o preço do crude.
As recessões não nascem em Portugal. Normalmemte são importadas dos EUA ou, nos novos tempos, do Oriente.
Culturalmente, a Direita pouco tem a dizer a não ser quando necessita de enviesar a História a favor de nacionalismos bacocos.

Embora, ainda temporalmente recente, a última República, criou uma identidade portuguesa, extremamente diversa da vida do Estado Novo que a precedeu.
Somos cidadãos europeus, participamos num projecto comunitário, temos lugar à mesa da comunidade das Nações.
Estamos em directa ou indirectamente englobados em grandes projectos, com as suas vicissitudes como não o estavamos desde a época dos Descobrimentos. Aliás a época em que Portugal depois dos desaires do Norte de Africa virou as costas à Europa, o que nos trouxe riquezas momentaneas, que rapidamente esbanjamos, e viria a custar-nos incomensuráveis atrasasos durante séculos com reflexos ainda hoje.

De facto, tornamo-nos, maiores. Politicamente, económicamente e em termos cívicos.

Mas podemos parecer - e parecer é diferente de sê-lo - adeptos de liberdades mais constrangidas , limitadas ou, no delírio da contradição, capazes de pôr em causa o regime democrático.

Como, por exemplo:

- Sou contra o liberalismo económico e, em consequência combato o liberalismo político.
Mas não sou contra as liberdades fundamentais do cidadão e sou pelo exercício dos mais amplos diritos e devres de cidadania;

Sou também contra o liberalismo político porque a sociedade não tem política social coerente e justa - paga pelas escolhas dos individuos;

Sou pela realização do indivíduo, assegurando-lhe direitos de cidadania, independentes da sua raça, sexo, religião, opção política.

Penso que a sociedade está em premanentemente em mutação e deixou de viver agarrada a consevadorismos bafientos (do tipo do s Conselheiros Acácios), como por exemplo:

- despenalização do aborto,
- legalização controlada das drogas "leves",
- criação de salas de "chuto",
- fornecimentos de seringas, nas prisões, farmácias etc.
- despenalização do "consumidor"
- união civil homossexual,
- adopção por homossexuais,
- operação de mudança de sexo em hospitais públicos.
- etc,

Sou, finalmente, contra o liberalismo económico que transforma o mercado - sem mecanismos de regulação - numa ponte e numa rede de interesses direta ou indiretamente ligados à corrupção, ao crime organizado, à violência, ao branqueamento de capitais e a perpetuação da violênia política e social, através do lucro desmedido e selvagem que nos tem arrastado para conflitos internos, regionais e internacionais.

Na verdade, todo o liberalismo político que, ao menor porblema, se atira contra as liberdades preferia viver num doce clima "conservador" (dos "bons costumes") onde os mordomos pensassem e usuferuissem da vida e regalias e os outros, os titulares dos direitos ordinários, vivessem subjugados e estrangulados, politica e socialmente.

Quero liberdade cívicas, sociais e culturais com infindável capacidade de optar, sem restricções, sem censuras, sem peias.
Quero e devo assumir as minhas responsabilidade e consequências perante a sociedade quando exerço o indeclinável direito de optar.
De escolher. De aceitar. De rejeitar. De me indignar. De protestar...
Só isto.

O liberalismo não me serve para nada! É uma falsa promessa para incautos.
Anónimo disse…
Excelente e oportuno post.
É de facto inadmissivel que se pretenda comparar o actual regime com o do "Doutor Salazar", como se fossem espécies do mesmo género. Mão se pode comparar coisas incomparáveis. No tempo do "Doutor Salazar" quem ousasse pensar de maneira diferente dele era demitido da função pública, preso, torturado e até assassinado (veja-se a extensa lista de assassinados publicada por Carlos Esperança no post a seguir a este). E havia, em grande parte da população, o medo de exprimir qualquer opinião ou de desagradar ao regime.
A Imprensa era censurada; as "eleições" eram aldrabadas; as poucas entidades eleitas democraticamente (como por ex. as Direcções das associações académicas), quando não agradavam ao regime eram demitidas por decreto e substituídas por "comissões administrativas" compostas por lacaios do regime.
As pessoas eram presas pela Pide durante meses e meses sem nunca serem ouvidas por um juiz ou sequer um magistrado do Ministério Público. A PIDE fazia o que queria; estava acima de qualquer lei, desde o Código de Processo Penal até à Constituição.
Mas agora há quem pretenda apresentar o regime salazarista como um regime "normal" e os seus lacaios como políticos "normais". Alguns ainda por aí andam, como por exemplo Jaime Nogueira Pinto - conhecido pelos colegas, nos tempos de estudante, como "Jaime Nojeira Pinto" - e o histriónico Dr. Hermano Saraiva, que apesar de ser irmão de um grande anti-fascista, António José Saraiva, que teve de se exilar para fugir à PIDE, foi ministro da Educação no regime fascista, em 1969, e tem a distinta lata, como aldrabão encartado que é, de dizer que a crise académica se 1969 "foi uma lenda"! A democracia é que é demasiado tolerante para com estes fascistas "branqueados", franqueando-lhes designadamente a televisão pública para virem impingir as suas aldrabices.
O único argumento verdadeiro que esses indivíduos têm para apresentar é o de que Salazar não era corrupto; mas Hitler também não era, e Stalin muito menos; o vício desse género de pessoas não é o dinheiro, mas o Poder.Mas, como muito bem disse Màrio Soares, Salazar, não sendo corrupto, era corruptor: corrompia quem lhe interessava, e rodeava-se de colaboradores corruptos, pois, conhecendo-lhes os "podres", tinha-os na mão.
CA disse…
Grandes vigilantes democráticos aqui vão.

Porque o regime actual ainda não está como o de Salazar (nem nunca poderá estar porque a história não pára e as ditaduras do futuro nunca serão iguais às do passado) concluem que está tudo bem. E fecham os olhos aos pequenos e grandes sinais de manipulação.

O que se passou com António Balbino Caldeira e com António Borges são sinais graves de que Sócrates vai até onde pode para perseguir pessoalmente quem o incomoda, mesmo que quem o incomoda tenha toda a legitimidade para o fazer. Ora quem quer o poder e não tem estómago para aceitar críticas legítimas e ainda usa o poder do estado para perseguir os críticos revela uma deficiência política grave para exercer o poder.

Quem não quer ver não veja.
CA disse…
Ana

O seu comentário preocupa-me deveras. É que, à falta de melhor argumento, vem com o desejo de perseguição criminal de quem critica politicamente este governo. Ora numa sociedade pobre, como o Portugal de Salazar, um operário tinha pouco a perder a não ser a liberdade, a saúde ou a vida. E era isso que Salazar tirava aos opositores. Para controlar a classe média da sociedade actual basta aos poderosos contratarem advogados caros e porem um processo a uma pessoa para fazer a vida dela num inferno, mesmo que o processo venha a ser arquivado. É o poder do dinheiro que pode ser usado para perseguir e calar hoje. Quando vejo o processo de Sócrates a António Balbino Caldeira, o que vejo? ABC divulga factos incontestados que Sócrates não é capaz de explicar satisfatoriamente do ponto de vista político. Sócrates pega numa frase, põe um processo a ABC, exigem a ABC que durante meses não se refira ao assunto (não percebo que segredo de justiça justifica isto), ABC tem que contratar advogados e no fim fica tudo em águas de bacalhau. Mas o processo sai muito caro a ABC. E serve não só de aviso a outros bloggers mais ousados como é invocado por socialistas para querer calar quem contesta este "espírito democrático".

Cuidado! Este socialismo que quer perseguir como pode quem o contesta é uma ameaça à democracia. E se a única resposta que têm para isto são os processos judiciais a quem o diz, então estão a trair todos os que morreram e foram torturados antes do 25A em nome da liberdade.

Contudo também antes do 25A havia quem fosse torturado e morto em nome da ditadura do proletariado ou da ditadura da violência. E esses, quando chegam ao poder, não são melhores do que os outros (cf. os movimentos de "libertação" de Angola, Moçambique ou Guiné-Bissau, por exemplo, e os regimes "livres" que depois implantaram).

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