CML – Falsos independentes

Disse um dia Raul Rego, referindo-se a Mário Soares, de quem era indefectível amigo e correligionário, que quem está sempre de acordo não é amigo, é um satélite.

Mas estar sempre em desacordo não revela independência de espírito, talvez manifeste imaturidade ou culto da personalidade. Pode acontecer por vaidade, despeito e falta de convicções. Ou oportunismo.

Em política é preferível descobrir quem está mais próximo do que quem mais se afasta. A animosidade dos dissidentes traduz, quase sempre, a revolta de quem não conseguiu dentro do partido a vitória das suas posições ou ambições.


Há uma plêiade de independentes profissionais, com lugar cativo na comunicação social, prontos a apontar a mediocridade dos políticos e a acorrer pressurosos a integrar comissões de honra e empresas de consultores.

Alguns resguardam-se nos conselhos de administração das Empresas Públicas e fazem ciclos de nojo, até às eleições seguintes, enquanto os que se comprometem sofrem as vicissitudes eleitorais, os riscos das decisões políticas e a devassa da vida privada.

Quem vive a política não pode ser independente. Pode não sentir motivação para militar num partido, mas sentirá o apelo das ideias, do programa e práticas do partido de que se sentir mais próximo.

Sair de um partido e vestir o fato de independente, sem período de nojo, é uma forma de enganar eleitores e atrair cúmplices aflitos para exibirem a suposta superioridade moral.

Se um político destacado abandona o partido para abraçar um projecto independente é de um projecto pessoal que cuida. Nessas circunstâncias lembro-me sempre da jovem que entrou num autocarro cheio e desabafou:

- Já ninguém dá o lugar a uma senhora grávida!
Um cavalheiro, que logo lhe ofereceu o seu, ainda ripostou:
- Não se nota!
- É só há meia hora.

Comentários

Anónimo disse…
Boa varada, Esperança! Numa senhora que eu cá sei?!
Anónimo disse…
Objectivamente: quem é se pode considerar como não dependendo de ninguém?.
Esta figura que surgiu na nossa Democracia, é um autêntico refúgio de pessoas que ... comungam de opiniões de outrém, mas não se querem assumir. Respeito o que eles e só eles se consideram, dentro do que entendo defender princípios fundamentais como o da liberdade de expressão; agora, desculpem a expressão, gato por lebre ... ...
jrd disse…
Concordo que há muitos independentes, uns agudos outros crónicos, que correspondem ao que descreves.
No entanto também conheço muitos que estão e bem, fora desse enquadramento e permanecem muito atentos, pouco veneradores e, acima de tudo, nada obrigados.
Anónimo disse…
Depreendo do post que o senhor CE é um satélite de Socrates. Mais nada.
Anónimo disse…
CE:

"Quem vive a política não pode ser independente. Pode não sentir motivação para militar num partido, mas sentirá o apelo das ideias, do programa e práticas do partido de que se sentir mais próximo."

1.) Quem vive a política pode ser independente. Quem vive da política é que não pode.

2.) Os partidos não são proprietários, muito menos exclusivos, das ideias políticas. Senão em vez de democracia tinhamos uma "partidocracia".

3.) A participação popular (teremos hoje "medo" de falar disso?) na política, seja através dos partidos, seja através de acções de cidadania não enquadradas, é legítima, complementar e diria... salutar.

4.) Os movimentos de cidadania têm ganho - à revelia das pressões partidárias - cada vez maior expressão nos Países livres.

5.) Também é certo e sabido que não há democracia sem partidos polítcos. Não haveria, pelo menos, um direito básico e fundamental - o direito de associação. Com a queda deste, haveria outras iniquidades e aberrações quanto às liberdades fundamentais.

6.) o direito de livre associação política não se restringe aos partidos. Ele deve ser compartilhado por todos os movimentos cívicos, de cidadania, associações de toda a ordem, etc.

7.) a democracia é sempre uma partilha. Os monopólios - sejam eles quais forem - são sempre um espartilho para a dita (democracia).

Finalmente, apesar destas questões de princípio, estou de acordo que, neste caso particular das eleições para a CML, o "estatuto de independente", saí machucado e vilependiado.
Não pelo conceito em si mesmo, mas pelo comportamento político dos personagens em causa, o que é outra coisa...
Anónimo disse…
"Disse um dia Raul Rego, referindo-se a Mário Soares, de quem era indefectível amigo e correligionário, que quem está sempre de acordo não é amigo, é um satélite."

Porra, Esperança é preciso ter tomates para ecrever isto... Quer dizer então que és um satélite do Sócrates, senhor "engenheiro"...
Anónimo disse…
Os independentes continuam a ser uma pedra no sapato dos partidos políticos portugueses, só assim se percebe este post.
Se os nossos partidos fossem fortes, com capacidade d auto-sustentação ideológica afastados da esfera do poder então a vinda dos independentes seria sempre vista como um enriquecer da discussão, mas na verdade temos partidos fracos, agarrados ao poder e ao Estado sem o qual não sobrevivem, pois não se podiam financiar ne financiar as suas clientelas e membros, logo qq coisa que possa enventualmente retirar-lhes um pouco (por muito pouco q seja) desses rendimentos é sempre visto como algo mau e a erradicar.

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