COIMBRA: Elucubrações sobre independentes e eleições autárquicas…

Não há fome de não dê em fartura’ diz o ditado. Este aforismo popular – que a presente crise financeira vem desmentindo - pode aplicar-se às próximas eleições autárquicas em Coimbra.
Ontem, o jornal Público anunciava a hipótese de poderem existir três candidaturas independentes  nas próximas eleições municipais em Coimbra link.
 
Colocando de fora da apreciação político-partidária sobre o ‘perfil matricial independente’ destas candidaturas (quase sempre regidos pela análise burocrática de ficheiros) a questão premente que se coloca aos eleitores será a seguinte: Nos últimos tempos a cidade foi tão discutida publicamente na sociedade civil para surgirem no terreno da disputa eleitoral uma tal variedade de opções?
 
Ou seja, existem tantos e tão distintos projetos discutidos, pensados ou delineados para o concelho que sejam capazes de motivar os eleitores e ter credibilidade (‘pernas para andar’)?
 
Ou, pior, vamos ficar pelos habituais chavões de que Coimbra está numa espiral de perda de espaço, protagonismo, voz e ‘capacidades’, sem explicar com que planos e meios se pode inverter esta dramática situação?
 
Onde se tem discutido o crónico atavismo da cidade que se instalou à sombra de uma velha Universidade, também em perda no contexto nacional?
 
Coimbra não tem, propriamente, uma ‘sociedade civil’, no sentido 'gramsciano' do conceito. Terá, quando muito, uma sociedade ‘escolástica’, fechada, obtusa, ainda arreigada ao sentido medievo do termo em que misturam posturas científico-filosóficas (académicas) com poses piedoso-religiosas (judaico-cristãs).
Não vemos, pela urbe, uma sociedade civil de pé. Muito do que é visível está sentado, isto é, 'colado à cátedra'.
 
A emergência de candidaturas independentes, oriundas destes labirínticos meios só acidentalmente poderá ser abrangente. Na maioria dos casos não ultrapassará a confraria, a seita, o club, o grupo, isto é, o sectorial. Ninguém representa o que em Coimbra se designa como a 'cidade futrica' (expurgada do sentido pejorativo do termo).
A tentativa de mimetismo do ‘caso Rui Moreira’, vitorioso no Porto, não cola na Lusa Atenas. Nenhum candidato do grupo dos independentes tem um perfil ligado à cidade, ninguém ‘frequentou’ ou ‘batalhou’ no associativismo industrial, comercial, nos movimentos associativos ou sindicais, na reabilitação urbana ou, mais concretamente, na resolução dos problemas da ‘Linha da Lousã’.
Os exemplos sobre estas ‘notórias ausências’ são múltiplos e o denominador comum é que essas candidaturas estão impregnadas de um tosco ‘pára-quedismo’.
 
Na realidade, os receios políticos (e não obrigatoriamente partidários) devem ser outros e mais vastos. A dificuldade dos partidos em congregar os cidadãos em torno de projetos de desenvolvimento local que hoje é pública e notória o que, na prática, têm desinteressado os munícipes das políticas autárquicas, não pode (nem deve) ser substituída pelo renascimento de míticas e obscuras “forças vivas”, surgidas a eito e a preceito.
Sabemos como, no passado salazarista, esse ‘caminho’ foi capaz de arrebanhar gente para projetos à volta de espúrios modelos de ‘Nação’. Não devemos (re)incidir no mesmo engano (‘corporativo’) cujas consequências conhecemos e conduziu sequencialmente ao exorcismo dos partidos políticos e à liquidação da Democracia.
 
O que realmente ‘faz falta’ a esta cidade, como de resto a muitas outras, é criar e alimentar ‘movimentos cívicos’ (económicos, sociais e culturais) capazes de pensar, discutir, construir e propor soluções para as múltiplas questões de proximidade.
Assim, ou a atividade cívica era publicamente reconhecida e capaz de influenciar as estruturas concelhias partidárias colocando o acento na defesa do progresso, dos interesses populares e da qualidade de vida dos conimbricenses ou, em contrapartida, candidatos independentes (‘naturais’) nasceriam deste limbo participativo e caldeados pelas agruras e andanças associativas (consideradas num sentido lato). Andar com o carro à frente dos bois é que não!
 
Em resumo, a assunção de uma plena da cidadania conduz necessariamente à rejeição de continuar a representar – por esse País fora - o papel de ‘indígenas da província’. E isto é tão verdade para os candidatos partidários, como para os ‘independentes’.

Comentários

Subscrevo naturalmente este post. Nem podia ser de outra maneira.
brites disse…

O desejo maníaco de Poder está a fragmentar ideias, partidos, sociedade.

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